Conexões importam, mas não sustentam resultados sozinhas

Liderança

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Valorizar as pessoas é essencial. Mas confundir um bom ambiente com produtividade pode minar resultados. Neste artigo, desmistifico o mito das conexões como solução universal e mostro como alinhar cultura humana com performance real.


Há um mantra contemporâneo ecoando pelos corredores das empresas, nos eventos de RH e nas timelines do LinkedIn: “As pessoas são o ativo mais importante das organizações.” Concordo. Mas com um alerta: isso não significa que conexões humanas, empatia e um clima amistoso, por si só, sejam garantia de produtividade ou inovação.

Vivemos um paradoxo no mundo do trabalho: nunca se falou tanto sobre cultura, pertencimento, bem-estar e saúde mental. E, ainda assim, os resultados não melhoraram na mesma proporção. Em alguns casos, até pioraram. Como explicar isso?

O que está em jogo não é apenas a humanização das relações de trabalho, mas a perigosa ilusão de que a simples valorização das pessoas, desconectada de processos, objetivos claros e responsabilidade seja suficiente para garantir um bom resultado.

A força das conexões humanas: verdade ou exagero?

Vamos começar do início: sim, conexões verdadeiras no ambiente corporativo são essenciais. Pesquisas do Gallup mostram que colaboradores que têm um “melhor amigo” no trabalho são significativamente mais engajados. Outro estudo da Harvard Business Review afirma que a sensação de pertencimento pode aumentar a produtividade em até 56%. Isso não é pouca coisa.

A ciência também confirma: interações sociais positivas reduzem o estresse, aumentam a liberação de ocitocina e contribuem para estados emocionais mais estáveis. Pessoas mais equilibradas emocionalmente trabalham melhor, colaboram com mais disposição e permanecem por mais tempo nas organizações.

Mas aqui começa o ponto cego.

Boas relações não resolvem maus processos

Você pode ter um time unido, simpático, carismático, afetuoso… e ainda assim estar operando muito abaixo do seu potencial.

Conexão sem direção vira confraria. Humanidade sem clareza de papéis vira confusão. Cultura calorosa sem metas vira zona de conforto.

É possível, e comum, equipes com um excelente clima interno e baixíssimo índice de entregas consistentes. Já vi líderes reféns do “bom ambiente”, hesitantes em cobrar resultados com receio de ferir sensibilidades. Já acompanhei times que confundem amizade com alinhamento profissional, confundem empatia com permissividade.

No fundo, há uma ideia enviesada de que um bom ambiente é aquele onde não há atrito. Quando, na verdade, ambientes saudáveis sustentam tensões produtivas. Há espaço para discordar. Há fricção criativa. Há desafio.

Conexões genuínas não são sinônimo de ausência de conflito. São, ao contrário, a base para enfrentá-lo com coragem, maturidade e respeito.

O mito da presença como produtividade

Outro equívoco muito comum, especialmente em modelos híbridos ou presenciais, é o da “presença significativa”.

A ideia de que estar disponível, acessível, sorridente e participativo é sinônimo de estar sendo produtivo. Não é.

Presença física ou emocional não garante entrega. Ser “gente boa” não resolve ineficiências crônicas. Participar de reuniões, interagir nos grupos de WhatsApp e trazer bolo no aniversário do colega não substitui foco, competência técnica e gestão do tempo.

Se a cultura da empresa valoriza mais a cordialidade do café do que o compromisso com as metas, algo está fora do lugar. Estamos romantizando a conexão e esquecendo que produtividade é, no fim das contas, sobre fazer bem feito o que deve ser feito, com constância e dentro do prazo.

Ambientes emocionalmente seguros também têm cobrança

Há uma idealização em curso sobre o que é um ambiente psicologicamente seguro. Muitos confundem isso com um lugar sem exigência, onde ninguém é cobrado, onde tudo se resolve com escuta ativa e acolhimento. Isso é ingênuo.

Ambientes saudáveis são aqueles onde há segurança para errar, mas também responsabilidade para aprender com o erro. Onde há espaço para ser quem se é, mas também para crescer além do que se é hoje. Onde há suporte emocional mas não ausência de pressão.

O que sustenta um bom clima não é apenas afeto. É estrutura. É um acordo claro entre liberdade e entrega. Entre empatia e eficiência. Entre conexão e desempenho.

Quando o vínculo vira muleta

Outro ponto pouco debatido é o da dependência emocional disfarçada de cultura colaborativa.

Você já viu times que só funcionam quando “a líder está por perto”? Ou colegas que param de produzir se não recebem “check-ins” constantes? Essa necessidade constante de validação, de apoio emocional, de reafirmação dos laços, pode parecer inofensiva. Mas gera vulnerabilidade sistêmica.

Organizações maduras desenvolvem autonomia relacional. Isso significa que as conexões existem, mas não engessam. Há confiança, mas também autonomia. Há suporte, mas não infantilização. Há relação, mas com fronteiras claras.

O papel da liderança aqui é fundamental: construir um espaço de confiança e entrega, e não um grupo de apoio afetivo onde os resultados se tornam secundários.

O engano da cultura “fofa” e improdutiva

No esforço de combater ambientes tóxicos, muitas empresas foram para o outro extremo: criaram culturas excessivamente permissivas, onde tudo é “resolvido na conversa” e o accountability desapareceu.

A empresa virou uma grande família. Só que famílias, por mais amorosas que sejam, não costumam ser eficientes. Não há metas. Não há prazos. Há amor, mas falta direção.

As melhores organizações operam mais como equipes de alto desempenho do que como famílias. Há afeto, sim. Mas há também meritocracia, cadência, cobrança justa e feedback honesto. Não se trata de “ser frio”. Trata-se de ser claro.

Conexão real é aquela que também confronta

É preciso desmistificar a ideia de que conexões verdadeiras são aquelas que “não criam ruído”.

Pelo contrário. Conexões verdadeiras enfrentam conversas difíceis. Dizem “não” quando necessário. Colocam limites. Cobram. Reconhecem e também desafiam. São vínculos onde a transparência é maior do que a conveniência.

Se você evita dar um feedback por medo de romper uma relação, então talvez a conexão não seja tão verdadeira quanto parece. Ambientes emocionalmente maduros sustentam relações que não dependem de constante validação. Que resistem a ruídos. Que sobrevivem ao desconforto da verdade.

E como criar a cultura certa?

Cultura organizacional é o conjunto de crenças, hábitos, símbolos e comportamentos que orientam a forma como uma empresa opera. Não adianta fomentar apenas o lado humano da cultura se os elementos estruturantes: metas, processos, governança, fluxo de comunicação, estiverem frágeis.

Veja algumas perguntas que ajudam a ajustar o foco:

  • As pessoas sabem o que se espera delas?
  • Existe clareza sobre metas e prioridades?
  • Os feedbacks são honestos e regulares?
  • A cultura tolera a mediocridade disfarçada de “boa convivência”?
  • As lideranças confundem acolhimento com omissão?

Quando as respostas a essas perguntas são corajosas, a cultura evolui. E a conexão passa a ser um alicerce, não uma cortina de fumaça.

A conexão que move é a que exige

Em última análise, o que estamos propondo aqui não é o abandono das conexões humanas no trabalho. Pelo contrário. É seu resgate mais profundo. Conexão verdadeira é aquela que exige o melhor de nós. Que acolhe, mas também impulsiona. Que compreende, mas não se acomoda. Que escuta, mas também fala o que precisa ser dito.

Pessoas são, sim, o valor mais importante das organizações. Mas só quando sabem para onde estão indo. Só quando se reconhecem como parte de um sistema que exige entrega, não só presença. Só quando se vinculam de forma madura, emocionalmente e profissionalmente.

Trabalhar com propósito é maravilhoso. Mas o propósito sem entrega é só uma boa intenção. O futuro do trabalho exige mais do que laços afetivos. Exige laços fortes o suficiente para segurar a pressão. E elásticos o suficiente para permitir o crescimento.

Se você quer criar uma cultura forte, madura e produtiva na sua empresa, que valorize as conexões humanas sem abrir mão da performance, conheça nossas palestras e programas de mentoria para líderes. Vamos conversar? Vamos agendar um café virtual para uma troca de ideias? Aguardo por você. 

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